Um ano restaurando a Caatinga: Aprendizados, sucessos, e próximos passos

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No final de 2023, recebi a notícia que nosso projeto de agrofloresta na Fazenda Xique-Xique, havia sido selecionado para participar de um programa de apoio à iniciativas de restauração. Enviamos o nosso projeto sem muita pretensão, seguindo uma sugestão de um de nossos amigos mais envolvidos no mundo de organizações internacionais. Durante esse ano com o programa Restoration Stewards 2024, eu e meu irmão, Gean, com quem colaboro para nossas atividades de restauração de nossas terras familiares que se encontravam em um estado de elevada degradação, pudemos dar continuidade ao nosso trabalho de restauração da Caatinga. 

O nosso projeto é localizado no território Quilombola Lagoas, na região semiárida do estado do Piauí, no Nordeste do Brasil. Nossa missão sempre foi a de defender o bioma Caatinga, que apesar de ser único no mundo e abrigar uma notável biodiversidade, atualmente enfrenta graves desafios, como a desertificação, secas prolongadas e o aumento das já naturalmente elevadas temperaturas devido às mudanças climáticas

Durante esse ano, fui exposta a várias novas circunstâncias e aprendizados.  Entendi a importância de mostrar nosso trabalho nas redes sociais, tanto para mostrar para o mundo os esforços que estamos liderados nessa região isolada do Brasil, quanto para incentivar outras pessoas sobre a importância da agrofloresta para a preservação da Caatinga.  

A exposição às redes regionais e globais de jovens ambientalistas também fomentou a nossa compreensão sobre a centralidade da troca de experiências e conhecimentos entre aqueles que buscam restaurar seus territórios. Muitos desses momentos de intercâmbio com outros participantes do programa Restoration Stewards e das sementes GLFx, facilitados pela equipe do GLF, nos ajudaram na ampliação de nossos conhecimentos sobre práticas sustentáveis, como na melhor compreensão das dinâmicas íntimas entre produção de alimentos e sistemas agroflorestais como uma estratégia de geração de renda para populações vulneráveis, e consequentemente, para a criação de  incentivos para a construção de mais áreas de agrofloresta.

Preparando estacas para produção de mudas. Foto: Maxim Jaffe.

Colaborações com nossa comunidade

Com o apoio do programa Restoration Stewards, realizamos cursos  com mulheres do quilombo que trabalham com produção agroecológica para apresentar a nossa experiência com práticas agroflorestais.  Nesses intercâmbios, foi possível criar espaços de troca de experiência, e em seus relatos, as mulheres envolvidas demonstraram grande satisfação em ter sido expostas para novas técnicas, como práticas de propagação de mudas.  Com as informações adquiridas nesses encontros, percebemos que cada vez mais mulheres do quilombo estão iniciando o trabalho com agrofloresta. 

Curso grupo de mulheres do Moisés                      Curso  grupo de mulheres do Boi Morto                    

Foto: Gean Magalhães                                              Foto: Gian Francésio

Avançando nossos esforços de restauração de terras degradadas

Com o apoio do programa Restoration Stewards, estamos produzindo 2.500  mudas para  restaurar  2,5 ha de terras degradadas. Estamos também trabalhando com o plantio de mudas nativas em outras áreas de nossa  propriedade familiar, que serão transplantadas assim que tivermos a época de chuvas produtivas.   Durante esse ano, também pudemos manejar e monitorar a área de agrofloresta que já havíamos implantado antes da nossa entrada no programa.  Nessas crescentes áreas de agrofloresta, podemos observar o aumento da presença de diferentes espécies de pássaros e seus ninhos, servindo como um lembrete da importância do reflorestamento para a conservação das espécies da fauna e flora da Caatinga.

Produção de mudas. Foto: Maria Magalhães.

Com o aumento da divulgação do nosso trabalho restaurando a Caatinga em redes sociais, também percebi um aumento na minha influência e tração na nossa comunidade e estado. Isso foi percebido, por exemplo, quando  fui convidada a ministrar cursos de quintais produtivos para um programa da assistência social da prefeitura de São Raimundo Nonato, município onde residimos.

Prática do curso de quintais produtivos. Foto: Lunara.

Durante esses cursos, fiquei muito feliz  em poder mostrar para a minha comunidade a importância de nosso bioma e de compartilhar meu entusiasmo com práticas agroflorestais. Foi uma enorme honra poder demonstrar para os participantes como agroflorestas podem facilitar a produção de alimentos sem desmatar. Muito pelo contrário – a adoção de sistemas agroflorestais permite que se conduzam esforços de reflorestamento ao mesmo tempo que se produz alimentos, provando a importância dessas práticas para a preservação da diversidade do planeta, a mitigação das mudanças climáticas, e  a proteção de todas espécies animais e vegetais que compõem as paisagens da Caatinga.  

Próximos passos
Existem muitos desafios na restauração de zonas áridas no contexto do semiárido Brasileiro. Como consequência das barreiras econômicas para estabelecer e manter atividades de restauração, muitos desses projetos duram pouco tempo e encontram dificuldades para dar continuidade aos seus esforços de reflorestamento, que naturalmente demoram longos períodos para que seus frutos comecem a serem percebidos. Com o aumento das consequências da crise climática, regiões semiáridas crescentemente enfrentam desafios para reflorestar devido aos prolongados períodos de seca, chuvas irregulares  e altas temperaturas. No nosso território, por exemplo, as primeiras chuvas do ano chegaram apenas em novembro de forma irregular, circunstância essa que dificultou a condução de nosso cronograma de restauração.

Apesar dessas dificuldades, consideramos que o nosso ano com o programa Restoration Stewards foi um enorme sucesso. Somos muito gratos pela oportunidade de fazer parte do programa e encerramos 2024 com o coração transbordando de felicidade por contar com o apoio do GLF  para expandir esforços de restauração  pelo  bioma caatinga. A minha participação no programa impactou minha vida profundamente. Hoje me sinto muito mais segura para apresentar meu trabalho e minhas ideias com confiança. Ser uma Restoration Steward, além de apoiar a nossa missão de restaurar a Caatinga, melhorou minha autoestima, e me lembro da importância de acreditar em mim mesma – uma mudança que tem me ajudado em todas as áreas de minha vida. 

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